segunda-feira, 20 de junho de 2016

Garota Dinamarquesa

Procurei mentiras onde podia me abrigar
qualquer trapo me servia
algo que se escondia bem no meio das pernas
eu era uma mulher no corpo de um homem
e me adoecia as fantasias que usava
era ultrajante que aquele terno roçasse tanto na minha pele
feito urticária
aquela voz que não era minha me seguia aonde quer que eu fosse
a boca sem batom
o meu nome não era meu
quando eu sem querer não atendia não era por mal
eu não me reconhecia quando me via no espelho
eu só vivia nos sonhos
ou quando sozinha
tive outro dia um dos sonhos mais lindos
eu saía na rua nua e todos me olhavam
eu era eu e me reconheciam
me debatia com meu feminino aflorado
correndo pela cidade rindo
com um riso que abria feridas
pra deixá-las sangrar e cicatrizar
naquele sonho morei eternamente
jurei não acordar nunca mais
naquele sonho eu te beijava e tu me beijava de volta por quem eu era
e eu era a mulher que sempre sonhei ser e não podia
morri pra viver de sonhos.

terça-feira, 14 de junho de 2016

Meu nome não é Maria


Meu clitóris enxerga toda a cegueira de vocês. Nos devaneios múltiplos pedem que eu grite enquanto gozo, querem ser avisados que seu ego vai morrer intacto, emudeço. Gozo silencioso. Descobri que poderia gozar aos cinco anos e me fizeram sentir nojo, agora pedem que eu abra as pernas sem pudor pro amor. Como, se eu aprendi a dizer que não gostava tanto assim? Como, se me tocar sempre foi um ato de condenação? Como poderia extrapolar as fronteiras da minha imaginação se os limites que me deram possuem arames farpados, muros mais altos que eu e soldados espreitando minha nudez, prontos pra atirar quando minha vulgaridade não os entretém. A boa moça da cidade não goza. A linda moça da cidade não caga. Tão fora da realidade que deve ser por isso que eu sempre penso estar num sonho, num filme, num livro. Padronizaram o sexo e todo desvio é perverso, o clitóris é banido. E há um exército de indícios escondidos, de arquivos queimados, de orgasmos culpados, de desencontros rítmicos. Foi impedido aos homens todo ato de elevada erotização por negar o feminino.